segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Falando em amor...





"... vou falar de mim. Como filha e como mãe. Um pouquinho só porque sei que não conseguiria dizer tudo o que talvez seja necessário – até porque começo e meus pensamentos por vezes se dispersam
A primeira lembrança que tenho na vida sobre “o que eu quero ser quando crescer?” é: “mãe”. 
Depois veio “jornalista”. 
Mas a primeira foi “mãe”. 
O amor que tive por meus irmãos – os três – foi incondicional. 
Sandro, talvez pela pouca diferença de idade entre nós, era como um bibelô. A vida toda, quando éramos pequenos, eu o defendia de tudo e de todos. E não me lembro de uma única vez, em todas as brigas de irmãos que tivemos, que eu houvesse levantado a mão pra ele. 
Quando Wan chegou, eu tinha oito anos – e pra mim, Deus tinha mandado aquele menininho lindo e inteligente por minha causa – era um presente de Deus pra mim. Da mesma forma, eu o defendia também – mas ele, de alguma maneira, era bem mais forte que o San. Sem contar que era o xodó de toda a família. 
Aí, aos meus dezoito anos, veio a Tati – e também foi como uma filha. Melhor, na verdade, pois eu não tinha obrigação de educar, só precisava amar e mimar. Mas claro, não foi só assim: quantas vezes conversamos, ela pequenininha e eu explicando porque não podia isso, porque não podia aquilo... 
A vida toda minha relação com meus irmãos foi de amor total e incondicional – mesmo quando, depois de crescidos, tínhamos divergências de opiniões ou entramos em atrito – porque esse amor gerou uma amizade que não tem preço. 
E que dá a certeza de meu lugar no mundo. 
E se, lá atrás, quando eu era pequenininha, tudo o que eu queria era ser mãe, com certeza é porque “mãe”, pra mim, era a melhor coisa do mundo. Pra pensar assim, eu tinha que ter a melhor mãe do mundo. E tive. Apesar de toda a divergência de pontos de vista que temos hoje, mamãe e eu, ela foi a melhor mãe do mundo – e eu não seria, nunca, nem a metade do que ela foi nas circunstâncias em que os filhos chegaram à sua vida. Com vinte anos mamãe tinha dois filhos e um marido irresponsável, que com o tempo se tornou alcoólatra. Veja bem, não estou aqui criticando meu pai, até porque acredito que ele foi o melhor pai do mundo – de verdade. Quando se conscientizou da importância do papel de pai, quando conseguiu se libertar do vício. E foi o melhor avô que meus filhos poderiam ter tido – sempre presente, brincando, ajudando, brigando, oferecendo colo. Não estou, de forma alguma, desmerecendo papai. Só estou contando que, por muito tempo, foi muito difícil para mamãe: casou nova; sem terminar sequer o segundo grau; porque já vinha de uma história familiar complicada (e apesar de tudo, você pode ver como ela e seus irmãos são unidos e amigos); sem profissão definida; com filhos pequenos e sem o apoio do marido. Sei que eu não teria sido metade da mãe que ela foi. Poderia contar pra você histórias e histórias sem fim de como ela fez empadas de batata e foram os salgadinhos mais deliciosos na festa da escola; de como ela saía comigo e meus irmãos pegando dois ônibus para passarmos um dia no clube; de como ela cuidou por dois anos de três filhos pequenos sendo que um, nesse período, passou por várias cirurgias e não podia nem ir ao banheiro sozinho; de como ela reformava, lavava e passava, deixando como novas as roupas usadas que ganhávamos; de como ela encheu de magia cada dia das nossas vidas com suas histórias e riso fácil; tantas histórias eu poderia contar! Mas não vem ao caso: eu só queria dizer que, se eu desejava mais que tudo na vida ser mãe, é porque eu tinha motivos mais do que suficientes pra achar que ser mãe era a melhor coisa do mundo. 
E eu não sabia que podia haver no mundo amor maior do que o que eu sentia por meus pais e meus irmãos – até o dia 25 de dezembro de 1985. 
A partir desse dia, descobri que ser mãe não é só a melhor coisa do mundo: é também a pior. 
Os piores medos, as piores dúvidas, os maiores anseios. E se meu filho não for "perfeito"? E se eu não conseguir educá-lo? E se ele ficar doente? E se ele não puder andar? E se ele não aprender a falar? E se eu não puder mandá-lo pra uma boa escola? E se ele não for inteligente? E se ele não fizer amigos? E se os amigos zombarem dele? E se algum maluco machucá-lo? E se ele não tiver namorado(a)? E se ele usar drogas? E se ele resolver roubar? E se ele se meter em brigas? E se ele não entrar na faculdade? E se ele não encontrar ninguém decente pra casar? E se ele não tiver filhos? E se ele tiver filhos e estiver longe de mim? E se seu(sua) companheiro(a) não gostar de mim? E se? E se? E se? 
Aí, num período da minha vida, me vi sozinha com três filhos. 
Como se diz no Rio Grande do Sul, “mais perdida do que cusco em procissão”. 
E se eu já me preocupava com eles, a partir daí essa preocupação dobrou, triplicou, sei lá. 
A sorte é que éramos amigos – sempre acreditei que deve haver amizade entre pais e filhos. 
Claro, sem esquecer o respeito e o laço mãe-filhos, ou pai-filhos. 
E a partir de então, essa amizade se fortaleceu. Minha amizade com Paula, Maya e Matheus sempre foi muito transparente – por mais que eu tenha errado. 
Sempre decidimos tudo juntos, e partilhei com eles minhas incertezas, meus medos, minhas dúvidas – por mais que isso fosse errado. 
E sempre tentei decidir tudo em nossa vida, principalmente quando morávamos todos juntos, de forma “democrática” e justa para todos – por mais que, muitas vezes, tenha que ter sido assertiva e impositiva. 
E essa amizade, essa relação, é baseada na confiança e na liberdade. 
Por vezes sou questionada: será que com o pai deles há essa atitude, há essa cobrança? Será que com o pai eles fazem isso, fazem aquilo? De verdade? Não me interessa. Não mesmo. 
Importa pra mim a relação que eles têm COMIGO – e pronto. 
Nunca, em momento algum da minha vida, pautei meus relacionamentos com base na comparação.
E não quero, nunca, que o relacionamento dos meus filhos comigo seja igual ao comportamento deles com o pai. 
O nosso relacionamento – eu, Paula, Maya e Matheus – nós construímos ao longo tempo, com nossas atitudes – fossem elas altruístas, egoístas, estúpidas, como quer que fossem. 
E é único: com Paula, com Maya, com Matheus."
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Trecho de uma carta não enviada falando sobre meus sentimentos.
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3 comentários:

  1. mãe, nem preciso dizer o quanto amo esse texto, né?
    e o quanto me emocionei ao lê-lo, né?
    e o quanto vc escreve maravilhosamente bem... e o quanto eu te amo, e o quanto isso é verdade, né?
    mãe, não tenha medo da solidão. a senhora nunca vai ser uma pessoa sozinha. mas, se por acaso ficar só, saiba que, às vezes, a solidão é muito melhor companhia.
    eu quero a senhora feliz, sempre.
    te amo. e amo estar aqui só por estar com vc!
    =)

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  2. Tia Lux: me emocionei lendo seu texto, relacionando tudo...

    Vc é uma mãe maravilhosa (palavra de quem conhece a mãe-lu pela boca da filha), jovem, amiga.

    Posso me espelhar em vc para construir meu relacionamento com o Macotonho?

    Bjooo!

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  3. Fiquei uns 20 minutos aqui tentando escrever um comentário, mas quer saber? Não tenho um que seja bom o suficiente. Só quero realçar o fato de que você conseguiu ser uma SHUMP mãe.


    Te amo! Sempre!

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